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No blogue escrevo meus próprios textos (contos, crônicas, poemas, prosa poética) e também sobre os mais variados assuntos: literatura, cinema, viagens, gastronomia, amenidades, humanidades, música. Tudo que me toca. E que possa tocar os leitores.

quarta-feira, 20 de junho de 2012

O amor, o aprendizado e enganos

Transcorrido o luto. Você já tirou o modelito preto, já não há lágrimas da perda, já não há lembranças, você já se divertiu em outros corpos e já descobriu que a vida pode ser mais bela e menos opressiva do que foi antes daquela morte. Você está em outra, feliz, caminhando na sua estrada de mão única sempre em frente, sem olhar para trás, que esse é um jeito seu de enfrentar a vida.
Não se visita o túmulo do morto, porque o otimismo não permite que a carne e a mente e o coração se lanhem e se tomem com vivências doloridas daquele durante difícil. Futuro colorido numa estrada de uma seta única, é que vc quer.
Mas há certos mortos que não se limitam a morrer apenas. Eles precisam dar o ar da graça, assombrar em certos momentos. E "estar na roda", para marcar sua presença.
Nesses momentos, quando tomada por essa energia de assombro, de aproximação, me lembro das mentiras, das tristezas e dos enganos do durante -- o fim de uma relação não é nada diante de um durante em que se revelaram tantos enganos depois.
Absorvido esse impacto, uma mulher feita de madeira de lei segue em frente, sem deixar de acreditar que existe algo na linha de frente que lhe será verdadeiro: e há! Uma mulher feita de madeira de lei tem lá seus encantos e qualidades, e isso a leva a um caminho em que a vida lhe oferece muitos presentes e surpresas boas e delicadas.
Há amores profundos e vulcânicos, que nos arrancam do mundo pequeno em que vivemos, para mais tarde nos revelar "enganos e mentiras". Impacto duríssimo na trama. Mas os amores pequenos, no rés do chão, que chegam mansos e humildes, sem levantar muita poeira, tentando nos conquistar devagar, nos levam serenamente pela estrada. Um amor aprendido, dia a dia. Eu cheguei a isso: um aprendizado amoroso.
A madeira de lei tem lá suas qualidades: "madeira resistente à ação do tempo, ao clima, às intempéries". Pode muito bem resistir à brutalidade, às mentiras e aos enganos, e chegar a esse patamar: um amor delicado, lento, que lhe devolve a tranquilidade e lhe dá o devido valor, que uma mulher madeira de lei merece.
Aos mortos, retornem a seu lugar, que é sua sepultura num país distante que se chama passado, pois não consigo pensar em nada que não sejam mentiras e enganos. Seu lugar é num país distante do que sou hoje: aquela mulher dos yellow cabs, que engolia as lágrimas e as respostas para não piorar situações, que silenciava em castelos, cujo coração disparava e se questionava se será que não tinha culpa daquilo tudo e se desculpava por erros que provavelmente não tivesse cometido, não existe mais. Ela também morreu. Ela se transformou numa estátua de sal naquela sepultura, e de dentro dela surgiu uma nova mulher, menos tolerante, ou nada tolerante com fatos que não merecem nem devem ser compreendidos.
E ela seguiu em frente à procura de uma nova vida. Portanto, aquele e-mail de meu aniversário jamais será respondido; considerei invasivo, o sinal está fechado para qualquer contato. Não há mais nenhum espaço na minha vida, mesmo que para um ingênuo e-mail de parabéns. Esse é meu inventário de tantas coisas que ambos sabemos que aconteceram. E que ficarão seladas entre nós.
Coisas boas? Sim houve, mas elas estão seladas comigo, com cera quente e um belo carimbo com minhas iniciais: elas são minhas.

Mentiras

Nada ficou no lugar
Eu quero quebrar essas xícaras
Eu vou enganar o diabo
Eu quero acordar sua família...

Eu vou escrever no seu muro
E violentar o seu rosto
Eu quero roubar no seu jogo
Eu já arranhei os seus discos...

[...]

Nada ficou no lugar
Eu quero entregar suas mentiras
[...]

Eu vou publicar os seus segredos
Eu vou mergulhar sua guia
Eu vou derramar nos seus planos
O resto da minha alegria...


[...]
(Adriana Calcanhoto)

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