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No blogue escrevo meus próprios textos (contos, crônicas, poemas, prosa poética) e também sobre os mais variados assuntos: literatura, cinema, viagens, gastronomia, amenidades, humanidades, música. Tudo que me toca. E que possa tocar os leitores.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

Depois daquele beijo



No post de 12 de junho, o fatídico dia dos namorados (sim em minúsculas!) para o solteiros que não querem estar solteiros, e o glorioso dia para os que amam, e uma chatice para os que acham uma breguice tudo isso, eu escrevi este trecho:

"'O amor está fora de moda', me disseram. Mas quem não gosta de usar um modelito vintage? Fora de moda ou não. Artigo de brechó ou simplesmente fluxo natural daqueles que não têm medo de si nem do outro. Não importa o tipo de amor, ou a quem o dedicamos. Amar nos tira desse lugar de saara humano e nos eleva à condição de renascer, sempre, ampliar o sorriso e usufruir daquele brilho que só os que amam podem ter...
A primavera ainda não chegou para nós, mas para quem ama, como eu, você e tantos outros, ela tem seu lugar reservado o ano todo."


É inverno, mas algo aquece aquele ponto atrás do meu osso esterno, aquele osso que liga bem no meio do peito nossas costelas, protegendo nossos órgãos mais delicados, o coração inclusive. Esse é o ponto que nos eleva às alturas ou pode também nos derrubar. Quando sabemos que uma relação está em seus estertores, esse ponto dói, e intuitivamnente sabemos que caminhamos para o fim. Tentamos nos enganar, camuflamos, tentamos colocar diques, deter a onda que invadirá e derrubará toda a construção. Não adianta. Quando o esterno dói, meu amigo, aceite, tome um Rivotril diariamente por um tempo, e caminhe por essa estrada dolorosa do fim de um grande amor.
Mas, caros leitores, a vida não é feita só de luto. Ela é feita também de sol nascente. E então, atrás do esterno, surge um calor, um conforto inexplicável, uma espécie de esperança e de crença no futuro e na recuperação.
Pois é, meu esterno já doeu muito. Mas não é que ele anda há bastante tempo numa espécie de sol nascente? Primeiro, foi um tipo de libertação, e eu me vi centrada no mundo, de novo resgatando meu lugar devido na vida. Me perguntei: por que isso não se deu antes? Com o passar do tempo, veio aquela certeza de nossa autoestima de que todo merecimento traz na esteira, além de boa maré, um bom peixe. Eu confiei nisso. E na minha sorte. E meu esterno clicou um sinal.

***

Mas fazia frio naquela noite, e São Paulo tem dessas surpresas em meio a sua dureza. Havia uma belíssima lua minguante sobre veludo negro. Na fila do cinema ela pôde sentir o calor, não de um corpo, mas de algo mais profundo e além. A lua estava ali, testemunha silenciosa do descongelar do ponto amedrontado do seu esterno. Gota a gota, o ponto ia se entregando. E ela ia escorregando, delicada, como de um rochedo; uma sereia entregue a seu pescador. É preciso reconhecer quando se caiu numa rede. Não há como escapar; é se entregar e calar.
Pois a sereia deslizava sua cauda por uma calçada arborizada ao lado dele, totalmente presa em sua rede -- mas como diria Camões, "presa por vontade"... De repente, sob uma árvore, eles deram o primeiro beijo. Delicado, suave, diferente de tudo que ela tinha tido como primeira vez, sem aquela sofreguidão e volúpia que ela costumava provocar em outros homens do mar. Por um átimo, ela abriu os olhos, e viu por entre as árvores a lua minguante, leitosa, generosa, quase se liquefazendo tamanho o calor daquela cena. O toque suave e morno e sedoso dos lábios dele teve tamanho impacto nela que a lua testemunhou: aquela sereia, a partir daquele momento, se transformou em uma bela mulher.
Tudo, tudo por causa do beijo delicado daquele pescador.

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