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No blogue escrevo meus próprios textos (contos, crônicas, poemas, prosa poética) e também sobre os mais variados assuntos: literatura, cinema, viagens, gastronomia, amenidades, humanidades, música. Tudo que me toca. E que possa tocar os leitores.

domingo, 29 de janeiro de 2012

"O último poema", resposta a Xico Santos e Ana C. e RedCat

"O último poema

Assim eu quereria o meu último poema.
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação."

(Manuel bandeira)


O ímpeto de postar Ana C. foi na madrugada. Fiz.
Depois de um sarau, ouvir palavras de açúcar cândi, palavras-tesoura e estilete e faca amolada, cheguei em casa e fui à minha estante real (nada de livros virtuais, pdfs e afins), quero papel e cheiro de tinta e prensa...
Peguei os exemplares de Ana C., como muitas vezes a poeta mais rápida do oeste, compulsiva, assinava.
Mais uma lembrança: A teus pés, Inéditos e dispersos e Crítica e tradução são livros de Ana C. que foram publicados numa coleção da autora entre 1998 e 2000 pela editora Ática. Tive o prazer e o deleite de trabalhar com esses originais com a editora responsável por esse material, Lizete Mercadante Machado, a nossa Liz, ou RedCat, como queiram.
Lizete e eu trabálhavamos juntas na Ática. Liz fazia todo o trâmite com Waldo Cesar, o pai de Ana C., que guardava e cuidava dos originais desde o suicídio da filha, claro que acompanhado pelos amigos mais próximos dela -- Armando Freitas Filho, Heloisa Buarque de Holanda, entre outros.
Ela editava os originais, exaustivamente conversava sobre eles com Waldo, lia, relia, resolvia dúvidas novamente; ao mesmo tempo, ficou imcumbida de escolher junto com o editor da arte (Marcello Araujo) a iconografia que acompanhou os textos. Waldo abriu fotos de infância e juventude, da família e de momentos íntimos de Ana Cristina.
Depois disso tudo, ela me chamou e disse: "Sandra, este é um original que precisa ser revisado com muito cuidado. A autora já faleceu, e o pai dela é muito rigoroso com o material, fotos, possíveis interferências e correções etc..." Eu interrompi Lizete e respondi: "Liz, fique tranquila, eu já conheço de trás para a frente A teus pés... Já li inúmeras vezes e tenho meu exemplar da edição de 1982, em que ela ainda estava viva quando foi publicado. Farei a leitura com o maior cuidado e delicadeza... Eu adoro poesia. Jamais faria interferências num original de Ana C."
Lizete suspirou, aliviadíssima e senti que se estabeleceu ali um ar de cumplicidade. Depois de minha leitura, o livro foi lançado e vieram os próximos. E Lizete sempre me dizia que Waldo Cesar mencionava sempre uma "pasta rosa", tesouro em que havia inéditos que a autora deixara inacabados antes do suicídio.
A Ática estava fazendo um canto de sereia para que ele liberasse esses originais da "pasta rosa". Foram anos de conversa, mas nada se concretizou. Waldo considerava que não era bom publicar textos inacabdos de Ana.
Pois ontem, depois de chegar em casa do sarau, em que ouvi tantas palavras "derramadas", "corpos de poemas", decidi que poria no ar minha seção de literatura "A biblioteca do Chacrinha" que estava atrasada, aliás. Fui à estante, sem dúvidas, certeira, peguei meus exemplares de Ana C., todos que tenho em papel. Fotos, poemas, cartas, frases, palavras dançaram ao redor neste meu espaço construído para se ter prazer.
Fui recortando os poemas que o sarau havia despertado na minha memória, estavam adormecidos. O sarau só fez as vezes do beijo do príncipe: os poemas de Ana C. acordaram lá num lugar distante onde estavam e vieram despertos e dispostos brincar de roda. Procurei na internet e vi que o Instituto Moreira Salles guarda o acervo da autora, a pedido de Armando Freitas Filho e da família, no Rio de Janeiro.
A "pasta rosa" foi enfim transformada em livro pelo IMS e se chama agora Antigos e soltos, publicação de 2008.
Acordo tarde, pois postar Ana C. me levou madrugada adentro.
Vejo um comentário de Xico com uma frase de Gikovate, que me remeteu a um poema de Manuel Bandeira, que abriu este post.


P.S.1. Depois de tanto tempo, continuo trabalhando com Lizete, a RedCat, que continua editora das ótimas. Conheçam O texto "O bricoleur", de Liz, em o caixote (revista eletrônica de literatura) em http://www.ocaixote.com.br/a_caixote21/cx21_contos_lizete.htm.
Acabei de reler e o coração faz subir um elevadorzinho de água até os olhos.

P.S.2. O Xico é editora da Altana e tem um blogue recente e textos (há muito tempo) belíssimos, conheçam: Folhetim de ausências http://folhetimdeausencias.blogspot.com/2012/01/bilhete_27.html.
"Bilhete" é um de seus belos textos.

Um comentário:

  1. Quanta saudade desse passado tão nosso presente, Sandra querida... O melhor de tudo foi a gente se aproximar tanto. Beijos.
    red
    cat
    liz

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