Quem sou eu

Minha foto
No blogue escrevo meus próprios textos (contos, crônicas, poemas, prosa poética) e também sobre os mais variados assuntos: literatura, cinema, viagens, gastronomia, amenidades, humanidades, música. Tudo que me toca. E que possa tocar os leitores.

domingo, 6 de novembro de 2011

Uma espécie de cura

Subo uma rampa longa e sinuosa, íngreme. Estou cansada. Mas tenho essa característica de ir até o fim em tudo que faço. Sigo em frente, não interrompo, quero chegar logo ao fim da missão. Tenho sede e meu corpo é todo uma dor de andarilho.
Depois de horas, no alto do percurso, encontro enfim o que procurava. O lugar é ali, e preciso me identificar. Me levam até ele, o oráculo, e me deixam a sós com ele. Não consigo ver seu rosto. Mas ele pode me ver toda, em detalhes. me sinto nua e transparente.
Pergunta o que quero ali, o que desejo saber. Depois de tanta caminhada e cansaço, sinto que perdi o foco e não sei mais o que gostaria de perguntar. Titubeio, errante, dou voltas em frases improvisadas para enganar mortais. Mas ele não se engana. Me interrompe: "Você está aqui com uma ferida aberta, é isso? Quer saber quando ela fechará. E quem será a boa alma que fará com carinho e delicadeza a sutura, para não lhe machucar ainda mais."
Cesso meu solilóquio improvisado para boi dormir. Apenas aceno com a cabeça: sim.
Ele então pega delicamente minhas mãos, diz que são mãos delicadas, mãos de quem tem o poder de curar os outros, mas que não pode curar a si mesmo, um Orfeu, é isso que sou. Uma ponta de tristeza lanha meu coração. Posso curar todos, exceto a mim. Depois, põe meu rosto entre suas mãos de outro mundo, observa longamente. "Seus olhos são olhos que vigiam o mundo e as pessoas. Nada lhe escapa. Por isso esta dor constante."
Fico pensando se ele me dirá o que vim para ouvir, e que ao longo do caminho havia me esquecido, tantos pensamentos haviam passado pela mente. Ele adivinha meu pensamento:
"Sua ferida aberta, que às vezes ainda sangra, está próxima de encontrar seu cura. Sua força leonina, de Hércules, a manterá inteira até que ele chegue com o medicamento. A cura está próxima. Mas terá de pôr um altar ao deus Cronos, há de se ter paciência. É só o que o tempo lhe pede."
Afasta-se então de mim, como se estivesse cansado, como se algo o tivesse exaurido. Vieram me buscar. Minutos depois, eu estava descendo o caminho de volta.
Minha ferida já doía menos. O sangue parecia um pouco coagulado.
Um alívio na alma me tirara 10 quilos do corpo.
A volta seria mais rápida e menos cansativa.
No caminho, vi flores e verde e céu azul, coisas que não vira na ida. E fiquei pensando no altar em minha casa: Buda, Shiva, incensos nepaleses queimando, Koani, a Nossa Senhora do budismo tibetano, um sol nascente que ilumina atrás de Buda, tudo sobre seda verde que me foi presenteada recentemente. Ali, instalarei Cronos e o reverenciarei todos os dias, e que me dê paciência e coragem para enfrentar a minha espera.
A ferida estará aqui, ansiosa pela cura, já que, como um Orfeu, eu posso curar os outros, mas não a mim.

Nenhum comentário:

Postar um comentário